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    supostamente, ela escreve

    Esse blog foi criado para que eu, Natália Oliveira, tivesse um espaço na internet para publicar meus textos. A bem da verdade, mais procrastino que escrevo, mas isso não me impede de sonhar acordada com o dia em que conseguirei escrever algo realmente bom. Sou saudosista da época dos blogs pessoais, gosto de histórias (e fofocas) e de jogos casuais. Esse blog já teve vários nomes (natalapses; natália non grata; olive trees, garnets and trains) e escrevo nesse espaço de forma inconstante desde agosto de 2016.

    Se quiser entrar em contato, basta deixar um comentário ou mandar um e-mail para mail.natalialvr@gmail.com.

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    shadowplay: 30 anos de história no cover do The Killers

    Em junho de 1976, os Sex Pistols fizeram um show em Manchester. Sem ensaio e sem repertório - já que o primeiro CD da banda só seria lançado cerca de um ano depois - o show foi tão ruim que a plateia, composta por cerca de 40 pessoas, saiu da pequena casa de show inglesa convicta de que conseguiria fazer algo melhor.

    O show medíocre foi o estopim para que Bernard Sumner e Peter Hook decidissem formar uma banda. Eles colocaram um anúncio em um jornal a procura de um vocalista e escolheram Ian Curtis sem ao menos fazer um teste. Meses depois, também por meio de um anúncio, Stephen Morris assumiu a bateria. Em 1978, os quatro rapazes lançaram quatro músicas compiladas em um EP: An Ideal for Living, a primeira gravação em estúdio da banda Joy Division.


    imagem por shelostcontrol-again.tumblr.com

    Em 1979, a Joy Division lançou seu primeiro álbum. Em linhas gerais, o Unknown Pleasures teve um sucesso tardio. Recebido com apatia por grande parte da crítica especializada, o disco ganhou notoriedade a partir dos anos 2000, marcando presença em várias listas como um dos melhores álbuns de todos os tempos. A capa icônica que, a grosso modo, representa a morte de uma estrela captada através de ondas de rádio, ficou popular na internet durante a ascensão do Tumblr, trazendo novos fãs para a banda - que, a essa época, já nasceram órfãos.


    Em 1980, Ian Curtis, responsável pelas letras pessimistas e pela voz rouca que dava o tom melancólico à banda, cometeu suicídio. Como uma forma de premonição bizarra e de péssimo gosto, a capa do segundo álbum da banda - que já estava finalizado quando Curtis faleceu - é composta pela foto de uma escultura presente em um dos jazigos do Cemitério Monumental de Staglieno. Cumprindo o acordo firmado entre os membros, a Joy Division teve fim logo após o lançamento do Closer. No mesmo ano, Bernard Sumner, Peter Hook e Stephen Morris se juntaram a Gillian Gilbert para formar o New Order.

    O New Order rompeu completamente com o estilo musical da Joy Division, se tornando uma das principais bandas de new wave dos anos 80 - gênero que Ian Curtis chamou de "estranho" em sua última entrevista. Mesmo assim, a banda costuma apresentar covers "repaginados" de músicas da Joy Division em seus shows, dando uma entonação mais dançante às composições originalmente soturnas. 

    Porém, ao meu ver (e essa é uma opinião que posso manifestar aqui porque, afinal, este é um blog pessoal), esses covers miram na homenagem, mas acertam no desrespeito. Nesse cover de Love Will Tear Us Apart, por exemplo, o tom da música é tão animado e dançante que soa como se estivessem dançando na cova de Ian Curtis. 

    lápide de Ian Curtis,
    cujo epitáfio é o título da música que o New Order canta com alegria e empolgação

    Pelas entrevistas, podemos perceber que todos os membros remanescentes da Joy Division se recusam a acreditar que Ian Curtis tinha depressão. Peter Hook, por exemplo, é enfático em dizer que ele era uma pessoa feliz, que "estava sempre rindo" e "gostava de piadas práticas", revelando uma visão estigmatizada de uma doença que não era abertamente discutida nos anos 80. Em função disso, os covers feitos pelo New Order tentam passar essa versão alegre de Curtis. Como um usuário do YouTube cirurgicamente apontou, o New order é basicamente uma negação da Joy Division.

    With Joy Division it sounds painful, With New Order it sounds joyful.
    New Order is basically the negation of Joy Division.

    Independente disso, ambas as bandas são responsáveis por influenciar incontáveis músicas contemporâneas. Por isso, um cover da Joy Division com um toque de New Order representaria não só a essência das duas bandas, mas também o impacto que ambas tiveram na cena musical - do pós-punk melancólico ao new wave dançante, do rock inglês ao pop norte-americano.

    22 anos depois...


    A história se repete - de uma forma menos trágica dessa vez. Após assistir a um show do Oasis, Brandon Flowers resolve criar uma banda de rock e conhece Dave Keuning por meio de um anúncio publicado em um jornal. Junto com Mark Stoermer e Ronnie Vannucci, eles formam o The Killers. As influências estão por toda parte: o nome da banda foi retirado de um videoclipe do New Order e seu último disco, Pressure Machine, tem mais referências a Joy Division do que consigo contar - começando pela capa. Por isso, nada mais justo que o The Killers se incumbir da missão de fazer a junção entre essas bandas lendárias.

    Closer (1980) x Pressure Machine (2021)

    Em 2007, a banda participou da trilha sonora do filme Control, que conta a história da Joy Division com foco na trajetória pessoal de Ian Curtis - o roteiro foi inspirado no livro Touching from a Distance, escrito pela esposa de Curtis. De acordo com Brandon Flowers, o diretor do filme pediu que o The Killers fizesse o cover de Shadowplay, sétima faixa do álbum Unknown Pleasures, para "mostrar que o Joy Division havia chegado até quatro crianças do deserto em Las Vegas, a mais de oito mil quilômetros de distância de Manchester". O resultado é uma música que respeita a tristeza da composição original e acrescenta o ritmo new wave sem pesar a mão.


    O lançamento da música veio acompanhado por um videoclipe com cenas do filme Control que mostram alguns dos principais momentos da história da Joy Division: o show dos Sex Pistols, a definição da capa do EP An Ideal for Living, o caderno onde Curtis escrevia suas composições (esse livro tem algumas fotos desse caderno) e vários outros detalhes da história da banda que ficaram de fora desse texto porque, afinal, isso aqui é um recorte. E foi assim que o The Killers conseguiu representar 30 anos de história em um cover.

    Algumas coisas que ficaram de fora do post


    • O famoso show dos Sex Pistols em Manchester é o ponto de partida do filme 24 Hour Party People, que retrata a cena musical de Manchester a partir da visão de Tony Wilson;
    • Tony foi baterista da Joy Division antes de se tornar empresário da banda. Ele também foi empresário do The Smiths e da Happy Mondays;
    • O nome "Happy Mondays" é um trocadilho feito com a música "Blue Monday", do New Order;
    • Morrissey (o controverso vocalista do The Smiths) e Mark E. Smith (vocalista do The Fall) também estavam no show dos Sex Pistols;
    • A depressão de Ian Curtis foi agravada por suas crises de epilepsia, que o impediam de fazer shows e de cuidar de sua filha Natalie;
    • A dança esquisita que Ian Curtis performava nos palcos era uma forma de tentar disfarçar suas crises epilépticas;
    • Deborah Curtis afirma que Ian teve um caso com a jornalista Annik Honoré. Até hoje, Annik nega o fato e afirma que os dois eram apenas amigos próximos #fofoca;
    • A música Colony, quarta faixa do álbum Closer, foi inspirada no livro Na colônia penal, de Franz Kafka;
    Em junho de 1976, os Sex Pistols fizeram um show em Manchester. Sem ensaio e sem repertório - já que o primeiro CD da banda só seria lançado cerca de um ano depois - o show foi tão ruim que a plateia, composta por cerca de 40 pessoas, saiu da pequena casa de show inglesa convicta de que conseguiria fazer algo melhor.

    O show medíocre foi o estopim para que Bernard Sumner e Peter Hook decidissem formar uma banda. Eles colocaram um anúncio em um jornal a procura de um vocalista e escolheram Ian Curtis sem ao menos fazer um teste. Meses depois, também por meio de um anúncio, Stephen Morris assumiu a bateria. Em 1978, os quatro rapazes lançaram quatro músicas compiladas em um EP: An Ideal for Living, a primeira gravação em estúdio da banda Joy Division.


    imagem por shelostcontrol-again.tumblr.com

    Em 1979, a Joy Division lançou seu primeiro álbum. Em linhas gerais, o Unknown Pleasures teve um sucesso tardio. Recebido com apatia por grande parte da crítica especializada, o disco ganhou notoriedade a partir dos anos 2000, marcando presença em várias listas como um dos melhores álbuns de todos os tempos. A capa icônica que, a grosso modo, representa a morte de uma estrela captada através de ondas de rádio, ficou popular na internet durante a ascensão do Tumblr, trazendo novos fãs para a banda - que, a essa época, já nasceram órfãos.


    Em 1980, Ian Curtis, responsável pelas letras pessimistas e pela voz rouca que dava o tom melancólico à banda, cometeu suicídio. Como uma forma de premonição bizarra e de péssimo gosto, a capa do segundo álbum da banda - que já estava finalizado quando Curtis faleceu - é composta pela foto de uma escultura presente em um dos jazigos do Cemitério Monumental de Staglieno. Cumprindo o acordo firmado entre os membros, a Joy Division teve fim logo após o lançamento do Closer. No mesmo ano, Bernard Sumner, Peter Hook e Stephen Morris se juntaram a Gillian Gilbert para formar o New Order.

    O New Order rompeu completamente com o estilo musical da Joy Division, se tornando uma das principais bandas de new wave dos anos 80 - gênero que Ian Curtis chamou de "estranho" em sua última entrevista. Mesmo assim, a banda costuma apresentar covers "repaginados" de músicas da Joy Division em seus shows, dando uma entonação mais dançante às composições originalmente soturnas. 

    Porém, ao meu ver (e essa é uma opinião que posso manifestar aqui porque, afinal, este é um blog pessoal), esses covers miram na homenagem, mas acertam no desrespeito. Nesse cover de Love Will Tear Us Apart, por exemplo, o tom da música é tão animado e dançante que soa como se estivessem dançando na cova de Ian Curtis. 

    lápide de Ian Curtis,
    cujo epitáfio é o título da música que o New Order canta com alegria e empolgação

    Pelas entrevistas, podemos perceber que todos os membros remanescentes da Joy Division se recusam a acreditar que Ian Curtis tinha depressão. Peter Hook, por exemplo, é enfático em dizer que ele era uma pessoa feliz, que "estava sempre rindo" e "gostava de piadas práticas", revelando uma visão estigmatizada de uma doença que não era abertamente discutida nos anos 80. Em função disso, os covers feitos pelo New Order tentam passar essa versão alegre de Curtis. Como um usuário do YouTube cirurgicamente apontou, o New order é basicamente uma negação da Joy Division.

    With Joy Division it sounds painful, With New Order it sounds joyful.
    New Order is basically the negation of Joy Division.

    Independente disso, ambas as bandas são responsáveis por influenciar incontáveis músicas contemporâneas. Por isso, um cover da Joy Division com um toque de New Order representaria não só a essência das duas bandas, mas também o impacto que ambas tiveram na cena musical - do pós-punk melancólico ao new wave dançante, do rock inglês ao pop norte-americano.

    22 anos depois...


    A história se repete - de uma forma menos trágica dessa vez. Após assistir a um show do Oasis, Brandon Flowers resolve criar uma banda de rock e conhece Dave Keuning por meio de um anúncio publicado em um jornal. Junto com Mark Stoermer e Ronnie Vannucci, eles formam o The Killers. As influências estão por toda parte: o nome da banda foi retirado de um videoclipe do New Order e seu último disco, Pressure Machine, tem mais referências a Joy Division do que consigo contar - começando pela capa. Por isso, nada mais justo que o The Killers se incumbir da missão de fazer a junção entre essas bandas lendárias.

    Closer (1980) x Pressure Machine (2021)

    Em 2007, a banda participou da trilha sonora do filme Control, que conta a história da Joy Division com foco na trajetória pessoal de Ian Curtis - o roteiro foi inspirado no livro Touching from a Distance, escrito pela esposa de Curtis. De acordo com Brandon Flowers, o diretor do filme pediu que o The Killers fizesse o cover de Shadowplay, sétima faixa do álbum Unknown Pleasures, para "mostrar que o Joy Division havia chegado até quatro crianças do deserto em Las Vegas, a mais de oito mil quilômetros de distância de Manchester". O resultado é uma música que respeita a tristeza da composição original e acrescenta o ritmo new wave sem pesar a mão.


    O lançamento da música veio acompanhado por um videoclipe com cenas do filme Control que mostram alguns dos principais momentos da história da Joy Division: o show dos Sex Pistols, a definição da capa do EP An Ideal for Living, o caderno onde Curtis escrevia suas composições (esse livro tem algumas fotos desse caderno) e vários outros detalhes da história da banda que ficaram de fora desse texto porque, afinal, isso aqui é um recorte. E foi assim que o The Killers conseguiu representar 30 anos de história em um cover.

    Algumas coisas que ficaram de fora do post


    • O famoso show dos Sex Pistols em Manchester é o ponto de partida do filme 24 Hour Party People, que retrata a cena musical de Manchester a partir da visão de Tony Wilson;
    • Tony foi baterista da Joy Division antes de se tornar empresário da banda. Ele também foi empresário do The Smiths e da Happy Mondays;
    • O nome "Happy Mondays" é um trocadilho feito com a música "Blue Monday", do New Order;
    • Morrissey (o controverso vocalista do The Smiths) e Mark E. Smith (vocalista do The Fall) também estavam no show dos Sex Pistols;
    • A depressão de Ian Curtis foi agravada por suas crises de epilepsia, que o impediam de fazer shows e de cuidar de sua filha Natalie;
    • A dança esquisita que Ian Curtis performava nos palcos era uma forma de tentar disfarçar suas crises epilépticas;
    • Deborah Curtis afirma que Ian teve um caso com a jornalista Annik Honoré. Até hoje, Annik nega o fato e afirma que os dois eram apenas amigos próximos #fofoca;
    • A música Colony, quarta faixa do álbum Closer, foi inspirada no livro Na colônia penal, de Franz Kafka;
    . 25 junho 2022 .

    5 comentários

    1. PASSADA QUE OS MEMBROS DA JOY DIVISION FIZERAM O NEW ORDER. nao tinha ideia. e tambem nunca tinha feito nenhuma reflexao desse tipo, mas depois de ouvir o cover do new order acho que ce tem razao!!!

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      1. ah: vale dizer que eu gosto muito desse cover de shadowplay. acho que inclusive gosto mais do que a versao original

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    2. Nossaaaa! eu revivi histórias da música que eu nem sabia que existiam ahahaha eu não sou muito desse estilo de música, mas conheço de the killers, e adoro algumas músicas deles. Mas não tinha a menor ideia de que foi uma inspiração com bandas tão antigas!

      As bandas antigas, dessa década de 80, eles tinham música na veia né?! era muito diferente do que é hoje! O post ta superrrr bom! <3

      beijos
      http://www.mairanamba.com

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    3. Não consigo nem imaginar o nível de sorte de colocar um anúncio no jornal e aparecer o Ian Curtis na sua porta. Surreal. Sempre fui mais team-Joy Division do que New Order (apesar de reconhecer a importância da banda para a música como um todo). Triste isso dos membros remanescentes da Joy Division se recusarem a acreditar que ele tinha depressão, não sabia.

      Não sei se você já assistiu Natália (eu ainda não consegui), mas acabou de rolar uma minissérie dirigida pelo Danny Boyle chamada Pistol ~ sobre o Sex Pistols, claro. Parece que é bacana. :)

      Beijos

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    4. Eu já tinha lido esse seu texto (ainda mais que é cheio de informações valiosas) mas agora eu comecei a ouvir Joy Division de verdade e lembrei que tu gostava e que tinha escrito esse texto hehe
      Adoro Disorder, She's Lost Control e Shadowplay. Sempre quis a camiseta desse álbum e agora talvez eu tenha aval pra usá-la? kkk

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